Músicas que nos fazem pensar - Admirável Gado Novo - Zé Ramalho

Com o infeliz advento do funk e do axé, não somos constantemente prestigiados com uma boa letra de música, aquela que nos inspira e nos faz viajar, ao mesmo tempo que uma séries de flashes passam por nossas mentes. Começaremos hoje uma série em nosso blog, “Músicas que me fazem pensar”. Uma maneira simples de sermos brindados com uma boa música e ao mesmo tempo podermos praticar o nosso senso crítico.

A primeira música de nossa série é: “Admirável Gado Novo”, de Zé Ramalho. A música foi lançada em 1979, ainda durante a ditadura militar, mas fez muito sucesso na novela de Benedito Ruy Barbosa, Rei do Gado. Como tema dos personagens de um acampamento de sem-terras, onde a trama principal tem uma atenção especial, a música resistiu ao tempo, e mesmo depois da novela de 1996, ainda hoje, em 2011 ela se torna cada dia mais contemporânea.

A música nos chama a pensar sobre a nossa sobrevivência e critica inclusive o nosso modo de pensar, porque vivemos uma vida de gado, somos marcados por um dono, e mesmo não tendo independência, somos felizes, ou pelo menos, temos a ilusão da felicidade. A bela letra ainda lembra que o povo não quer ser ignorante, mas vive muito perto dela. A grande verdade de que estamos em uma cela, e a contemplamos esperando melhores dias, ou de simplesmente esse mundo de injustiça e miséria se acabar, sem falar no egoísmo, faz parte do nosso cotidiano de esperanças.

Damos muito mais que recebemos, os nossos impostos são mal gastos e as oportunidades são quase inexistentes. E como o gado que é marcado pelo seu dono, o povo vive condenado a receber apenas aquilo que o concedem, mas com a clara ilusão de felicidade.

Mas a música não sela o destino de ninguém, simplesmente nos lembra do que nos assola e nos alerta para a necessidade de fazermos algo, até porque podemos observar que toda essa engrenagem, já sente a ferrugem lhe comer.                                                                                    

Vocês que fazem parte dessa massa
Que passa nos projetos do futuro
É duro tanto ter que caminhar
E dar muito mais do que receber...
E ter que demonstrar sua coragem
À margem do que possa parecer
E ver que toda essa engrenagem
Já sente a ferrugem lhe comer...

Êeeeeh! Oh! Oh!
Vida de gado
Povo marcado, Êh!
Povo feliz!...(2x)

Lá fora faz um tempo confortável
A vigilância cuida do normal
Os automóveis ouvem a notícia
Os homens a publicam no jornal...
E correm através da madrugada
A única velhice que chegou
Demoram-se na beira da estrada
E passam a contar o que sobrou...

Êeeeeh! Oh! Oh!
Vida de gado
Povo marcado, Êh!
Povo feliz!...(2x)

Oooooooooh! Oh! Oh!

O povo foge da ignorância
Apesar de viver tão perto dela
E sonham com melhores tempos idos
Contemplam essa vida numa cela...
Esperam nova possibilidade
De verem esse mundo se acabar
A Arca de Noé, o dirigível
Não voam nem se pode flutuar

Não voam nem se pode flutuar
Não voam nem se pode flutuar...

Êeeeeh! Oh! Oh!
Vida de gado
Povo marcado, Êh!
Povo feliz!...(2x)