A nossa consciência negra, tem que ser diária, pois só
assim, reconstruiremos um país, que sem os negros, não teria razão de existir. É
dia para se entender, depois de se conhecer a história, de reconhecer uma
dívida importante deste país com os negros. Esta dívida se revela no histórico
de escravidão, condenação a presença na margem da sociedade, e tudo isso visto
criado, por uma elite, que na época cafeeira, mas que hoje, por incrível que pareça
ainda se orgulha dessa elite e da monarquia escravocrata e assassina.
Quando
Portugal decidiu o que fazer com as terras da então “Terra de Vera Cruz”, o
plano inicial era plantar cana de açúcar, e para tal intento, o trabalho
escravo era mais do que necessário. Os índios foram então obrigados a trabalhar
nos engenhos de açúcar brasileiros, porém, considerados bárbaros, e
preguiçosos, foram logo substituídos por uma experiência bem sucedida, para os
portugueses, nas ilhas de Cabo Verde e Açores, o trabalho escravo dos negros
africanos. Começava assim um capítulo triste e sem precedente na nossa
história, que teve a autorização e a benção, inclusive da Igreja Católica, que
considerava os negros algo sem alma.
O
trabalho escravo no Brasil, continha portanto a presença maciça no negro
africano, que retirado de suas terras, eram vendidos pelos seus, e trazido para
o Brasil, em navios negreiros, que quando com muita sorte, chegava pelo menos
metade vivo, e a outra metade era jogada no mar, alguns inclusive doentes,
porém vivos. O tempo vai passando, e o Brasil, se torna em uma terra de negros,
graças a Deus. Mas essa terra considerada bárbara, e suja, pelos europeus, e
principalmente, pela metrópole, passa a ser a única saída para um Imperador
frouxo e enrolado, e de sua corte “civilizada”, que veio ao Brasil para fugir e
para mamar nas tetas de um povo já explorado, e sempre colocado de lado. Em
1808 mais 12 mil pessoas desembarcam no Brasil, primeiramente em Salvador, e
pelo fato de ter muitos negros, se dirigiram para o Rio.
E
por falar em Rio, por aqui, o Café se tornou o maior produto de exportação do
Império, e claro, por causa principalmente do trabalho escravo. Fazendas e mais
fazendas de café, tinham negros sendo obrigados a trabalhar nos cafezais, e
condições infernais, sendo castigados e humilhados dia a dia. Essas fazendas,
que se encontravam principalmente no interior do Rio, onde muitas cidades foram
formadas através desta escravização, sempre tiveram a presença de famílias
importantes, que através de seus sobrenomes, tinham o péssimo hábito de
colecionar pessoas. Esses seres, que se diziam católicos, gostavam de brasões,
e se achavam poderosos, e de fato eram. Esses escravocratas têm seus
descendentes até hoje, achando bonitinho um passado de senhores de escravos, e
uma monarquia assassina, porém suas riquezas já foram perdidas. Mas não
perdendo o foco, o trabalho do negro era tão importante, que a frase “O Brasil
é o café, e o café é o negro”, ganhava força.
Zumbi dos Palmares |
A
resistência dos negros, também foi um capítulo importante da nossa história. Os
quilombos ficaram conhecidos pela força do grito de liberdade, e na medida em
que o tempo passava, ficavam cada vez mais lotados. Zumbi dos Palmares foi o
maior ícone dessa resistência, e na segunda metade do século XVII, o Quilombo
dos Palmares conhece seu auge. Zumbi, seu maior líder, é sem sombra de dúvida,
o símbolo dessa resistência. Apesar do Quilombo ter sido extinto por Domingos
Jorge velho em 1710, Palmares se transformou em algo maior ainda no imaginário
das pessoas daquele tempo.
O
mais importante desse dia, é tentarmos entender quem realmente somos. Os negros
contribuíra, para essa sociedade, muito mais do que com o samba e o talento com
futebol. A própria Capoeira, que hoje está muito mais difundida, foi durante
muito tempo, um dos grandes momentos de resistência, e já também, após a
libertação dos escravos. O Capoeira passou a ser sinônimo de um rótulo, feito
por uma sociedade elitista que tinha aversão a negros.
A
Abolição da escravatura foi um engodo, uma falácia. E para aqueles que veneram
Princesa Isabel, a abolição não foi declarada porque a mesma era contra a
escravidão, pelo contrário. As pressões de todos os lados a fizeram encurralada
a assinar a Lei Áurea. E a maneira como ocorreu a abolição demonstra isso. De
uma hora para outra, sem indenização alguma, sem nenhuma reparação, os negros
saíram das fazendas e foram jogados a própria sorte, “inseridos” em uma sociedade
racista, os obrigando até mesmo a se arrepender de serem libertos. Os anos se
passando, os negros foram se virando, e mesmo assim, foram sendo expulsos de
cortiços, de suas “repúblicas”, enquanto a República tentava se consolidar, mas
sem sucesso, não conseguia ter o apoio do povo, e na sua maioria, os negros.
Quando
analisamos a nossa história, não se precisa de muito para se perceber que a
reparação é necessária. Durante algum tempo fui contra as cotas para negros em
universidades. Mas depois que se lê, e se aprende, os nossos conceitos passam a
ser revistos. Existe uma dívida deste país com os negros, e não apenas por suas
contribuições impagáveis, mas pelo o que lhe foi tirado. Principalmente para
aquilo que lhe foi determinado. As margens da sociedade, não sobrou muito para
os negros. A falta de oportunidades e de chances foi determinante para alguns
quadros sociais existentes até os dias atuais. A falta da presença de negros em
uma série de faculdades públicas, em cargos altos de grandes empresas, na
própria política, entre outros. Mas em sua
maioria, nas favelas, nos presídios. Um exemplo simples, os canteiros de
obra para a Copa do Mundo, está cheio de negros, mas no estádio, poucos estarão
lá, assim como já podemos verificar no novo Maracanã.
Não
é hipocrisia, não preciso. Basta olhar a vida de modo diferente, e não tentar
maquiar a história. Não ver a vida pelo olhar da Classe Média egoísta, que
acredita que vivemos em um país das maravilhas, onde as oportunidades existem
para todos. Não podemos ver a vida através do olhar de uma elite escravocrata,
que através de sobrenome arraigado, ainda persiste em tentar buscar o poder, e
idolatrar os brasões, adorando a monarquia. Não podemos ver a vida, como um
inglês, morando na África do Sul na década de 60. Precisamos de mais, de uma
visão diferenciada da vida, de uma visão justa, e diante disso, precisamos
reparar tudo o que foi feito através dos tempos, através da história. Os negros
merecem respeito, e o racismo existe neste país sim. Esse racismos está em cada
ponto, em cada esquina, em cada empresa, em cada fala, em cada posição, em cada
novela, onde o a presença dos negros é ridiculamente pequena. O racismo vive,
mas a nossa consciência tem que ser mais viva ainda. Essa consciência tem que
viver todos os dias. A nossa consciência negra, tem que ser diária, pois só
assim, reconstruiremos um país, que sem os negros, não teria razão de existir.